É preciso limitar a liberdade de expressão?

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16.2.15

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A História já demonstrou que, não raro, ideias absurdas, insustentáveis em qualquer debate ético minimamente racional, conseguem alcançar o patamar de paradigmas sociais. Por outro lado, são inúmeros os casos nos quais princípios razoáveis se estabelecem e passam a guiar o comportamento humano. Independentemente da situação, entretanto, o sentido do que é mais sensato a uma sociedade não necessariamente reflete a opinião de todos os seus membros. Sempre existem os discordantes: alguns são passivos e resilientes; outros agem ativamente frente ao status quo.

Entre esses últimos, estão os que pensam à margem do sistema, desejando se expressar como bem entendem, na esperança de conseguirem reverter o quadro para o seu lado; existem aqueles denominados de humoristas, cujas opiniões são indeterminadas por seu discurso, do qual apenas se pode esperar uma tentativa desesperada de provocar riso, com a frieza de um trabalho qualquer; e, finalmente, há os que mesclam elementos desses dois grupos, acreditando transmitir uma comoção social através do humor e da arte. Todos eles, ao dependerem da discórdia e da contravenção deliberadas, são escravos da liberdade de expressão.

É ela a entidade que controla até qual ponto se pode discursar sobre determinado assunto, e cabe aos governos decidirem se haverá limites ou não para o seu uso. Nesse processo decisório, apenas um critério deveria ser levado em conta: a intensidade com que certo grau de liberdade pode afetar negativamente a vida de outras pessoas. Se outros elementos são levados em conta, torna-se clara a presença de interesses autoritários na liderança da sociedade. Uma questão muito importante, nessa discussão, é como se pode afetar a vida de alguém negativamente. Uma piada teria esse poder? É claro que não.

Se a intenção é a de provocar risos, não devem existir limites, pois não há nada para ser restringido. Uma piada é um texto ideologicamente nulo, embora os senhores do politicamente correto digam o contrário. Caso haja ideologia envolvida, o texto deixa de ser piada, para se tornar uma espécie de discurso cômico. Um humorista alinhado à liberdade de expressão identifica situações geradoras de humor, não importa se elas envolvam negros, homossexuais, religiosos ou paralíticos. Isso não quer dizer, porém, a inexistência de ofensas, as quais nada mais são que reações emocionais frente à discórdia. Por isso, não se pode utilizar o fato de alguém se ofender como critério para limitar a liberdade, pois, na maioria das vezes, não há um motivo objetivo e universal para se justificar a ofensa.

Para os outros casos, nos quais as intenções são de manipular massas, moldar pensamentos e organizar movimentos, a liberdade de expressão precisa ser policiada, mas sempre lembrando de que o critério único é o modo como os outros são afetados. A partir do momento em que um discurso assume caráter de ódio contra um grupo e, naturalmente, sugere atos violentos, este deve ser limitado. O mesmo vale para iniciativas antidemocráticas, cujas ocorrências levariam ao suicídio da liberdade de expressão.

Em resumo, a chave para essa questão é buscar parâmetros bem definidos para julgar as situações, ignorando, sempre que possível, fatores meramente emocionais. Afinal, não é a liberdade de apenas um grupo que está em jogo, mas a de todos os indivíduos, cada qual com seus interesses e necessidades.

Algumas propriedades dos binários

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20.12.14

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Percebi, dia desses, que sei pouco sobre os binários. Eles são números escritos em uma base muito importante para quem gosta de computadores e pretende trabalhar na área de software. Recentemente, a notícia de que a Google precisou adequar os seus servidores para aceitarem representações numéricas de 64-bit, graças à música do Psy - cujo nome prefiro não citar, para atrasar futuros esforços da gigante - corrobora o fato de o quão é importante entender a base 2 e seus efeitos sobre os sistemas de informática.

Além disso, durante minhas experiências com linguagens de alto nível, percebi que utilizo muito dos métodos de conversão de dados, quando não é o próprio interpretador que realiza essas transformações. Será que o que ocorre nesses processos é o caminho mais eficiente? Será que, entendendo melhor os binários, teremos condições de compreender mais os nossos códigos e, assim, poderemos escrever programas melhores? Não sei ao certo, mas, independentemente das respostas, estou seguro do valor de se compreender as nuances, pouquíssimo ensinadas, acerca dos números binários.

Abaixo, estão algumas propriedades interessantes - ou curiosidades, dependendo da importância que você a elas atribui -, listadas aqui como um modo de referência para mim mesmo, e, claro, para quem chegar a esta página. 

Pares e ímpares

Terminou em 0? É par.
Terminou em 1? É ímpar.

Por quê? Simples! O último número ser 1 significa somar 1 à soma das potências de dois (que é sempre par), resultando num ímpar.

Divisibilidade por 2n

Se o número termina em n zeros, será divisível por 2n.

Igual a 2n

Se o número contém 1 na posição n e zeros em todas as outras, ele vale 2n.

Igual a 2n - 1

Se o número contém 1's do fim até a posição n-1, com todos os outros bits iguais a 0, ele vale 2n - 1.

Duplicando números rapidamente

Basta deslocar cada bit uma posição à esquerda.

Exemplo: 1010 (10) e 10100 (20).

Dividindo números sem sinal (unsigned) por 2

Basta deslocar os bits uma casa à direita. Se é ímpar, é arredondado para baixo.

Exemplo: 1010 (10) e 101 (5); 1011 (11) e 101 (5).

Quantos bits para guardar uma multiplicação?

Para multiplicar dois binários de n-bit, é necessário um número com, no máximo, 2*n bits para guardar o resultado.

Quantos bits para guardar soma ou subtração?

Para somar ou subtrair dois números com n-bit, nunca serão necessários mais que n+1 bits.

Negativar e subtrair 1 rapidamente

Basta inverter os bits.

Exemplo: 01101 => 10010, pois, por complemento de dois, a negação é 10011, do qual se subtrai 1, ficando com 10010.

Obtendo 0

Basta somar 1 ao maior número sem sinal (unsigned), para determinado número de bits, claro.

Obtendo o maior número sem sinal (unsigned)

Basta subtrair 1 de 0, para determinado número de bits.

Combinações de n bits.

Sempre, no máximo, 2n.

A explicação, aqui, pode vir do PFC (Princípio Fundamental da Contagem). Se temos 4 bits, temos, digamos, esta situação: __ __ __ __. Cada traço pode receber 2 valores, ou 1 ou 0. Sendo assim, teremos 2*2*2*2 possibilidades, ou 24 = 2n, considerando nosso querido n = 4.

Tudo 1

O número 2n - 1 contém n bits, cada qual possuindo o valor 1.

Exemplo: para n = 4, temos 24 - 1 = 15, o qual corresponde a 1111 em binário.

A ira de Bonner

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20.8.14

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Todos assistiram, na noite de ontem, a um massacre de fazer inveja ao Marcelo Rezende e ao Datena. O autor dos disparos foi o âncora mais famoso da Globo, William Bonner. A vítima, nada mais, nada menos, que a presidenta deste país e candidata à reeleição, Dilma Roussef. Durante a entrevista, cada pergunta certeira provocava, na atacada, nervosismo e emissão de palavras e expressões desconexas. Há quem diga que o princípio da imparcialidade jornalística não foi considerado naqueles poucos minutos, ainda mais quando se compara a referida entrevista a outras realizadas com os demais candidatos. Apesar disso, aquele momento foi um dos mais importantes para o processo eleitoral deste ano.

À princípio, é importante salientar a grande vantagem da presidenta quando se trata de sua promoção eleitoral, pois ela tem o poder de tomar iniciativas públicas de cunho fortemente favorável à sua eleição. A isso se soma o fato de que Dilma possui 11 minutos e 24 segundos disponíveis para suas propagandas no horário obrigatório, enquanto os outros dois candidatos mais cotados, juntos, têm pouco mais da metade desse tempo. Além disso, o PT, por alguma razão, conseguiu criar, nos brasileiros, o sentimento de que o estado no qual se encontram é o mais seguro possível, e que mudar de governante seria muito arriscado. Todos esses fatores propiciam uma enorme vantagem à presidenta, a qual, além de ter edificado um comodismo sólido no povo, possui mais oportunidades de agregar elementos positivos à sua candidatura.

A fim de se promoverem discussões comprometidas com a realidade, é fundamental a existência de agentes capazes de balancear tamanho favorecimento. O principal deles são os debates na mídia, nos quais os candidatos demonstram o quão seguros estão acerca das diversas questões relacionadas à sua vida pública e às suas intenções e ações quando diante do poder. O confronto é o elemento principal desses
eventos, é o instante no qual os envolvidos são colocados frente a frente com as suas atitudes suspeitas, os seus faturamentos sem explicação, os seus resultados pouco divulgados e as decisões controversas de seu grupo ideológico. As entrevistas, por sua vez, eram apenas mais um meio de divulgação das campanhas ou, no máximo, um espaço para perguntas leves, com um nível baixo de controvérsias.

Ontem, Bonner alterou isso. Ele poderia ter aliviado o discurso, poderia ter dado a ele um tom mais jornalístico, mais suave, mas não o fez. As razões são das mais variadas, dado o histórico da Globo de favorecimento de candidatos em eleições presidenciais. Mas, por mais imprudente que o âncora tenha sido, não se pode negar o grande serviço por ele executado: as questões mais críticas do governo de 12 anos do PT foram jogadas, fervendo em sua forma mais pura e simples, nos braços de Dilma. Por que, durante todos esses anos, a saúde se mantém em um nível tão deplorável? Por que a economia passa por uma fase tão ruim? Ao consentir com a visão petista de que os mensaleiros são, na verdade, heróis, não estaria a presidenta sendo conivente com a corrupção?

Tais perguntas poderão surgir em alguns dos muitos debates próximos, mas talvez fossem entendidas como meras picuinhas entre políticos tentando derrubar uns aos outros. Fazê-las no Jornal Nacional, em um tom impositivo, colocando à prova a imagem consolidada da presidenta segura e bem-feitora, pode ter sido um erro jornalístico muito grave; porém, adequou-se à necessidade de se confrontar o status quo. A atual presidenta não conseguiu responder de forma clara aos questionamentos, sempre tentando desviar dos temas propostos, apesar dos esforços do jornalista; e, quando respondia, fazia-o com insegurança e confusão. Bonner descarregou o cartucho, metralhou a muralha. Agora resta esperar que o povo não tenha ignorado os deslizes da presidenta, e comece a basear o seu voto em algo além de mero comodismo.

Um clássico em território potiguar

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23.6.14

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É com grande tristeza e comoção que a vez de Natal chegou. Alguns pontos da cidade, desde a semana passada, vêm sofrendo com a fúria da natureza. Sim, essa impiedosa entidade, que a si própria tantas vezes destruiu e recriou, agora inocula, sem aviso prévio, seu límpido veneno sobre este lugar. Todos os esforços empregados pelas gestões ao longo desses anos, todas as leis do plano piloto criadas e respeitadas à risca pelos moradores e órgãos públicos e tantas campanhas em prol do correto uso dos terrenos civis de nada serviram perante as chuvas incontroláveis deste mês.

É claro que todo esse palavrório é fajuto e, se você é um brasileiro consciente, certamente leria o parágrafo acima com um mínimo de ceticismo. Essa personificação da natureza é a principal ferramenta usada por governos para tentar livrar de suas costas a culpa por desastres, e até constituiria uma justificativa válida, mas somente se esses fossem os primeiros acidentes naturais vivenciados pela humanidade, o que não é o caso. A natureza já obrigou, e continua a obrigar, a espécie humana a se adaptar das mais diversas formas, disso se sabe muito bem. Nesse cenário, há duas atitudes possíveis a se tomarem: prevenir-se ou ignorar os avisos e remediar os efeitos das catástrofes quando elas ocorrerem. Ao menos hoje, a segunda via é a que impera no Brasil.

E não é necessário retroceder tanto no tempo para encontrar exemplos. Todos os anos, várias regiões do país sucumbem perante a chuva, a qual destrói vidas e lares, deixando milhares de famílias desabrigadas e desoladas. Em 2011, na Região Serrana do Rio de Janeiro, 900 pessoas morreram e mais de 150 permaneceram desaparecidas naquilo que foi considerada a maior tragédia natural da história do Brasil. Esse é um fato previsível; é, como se diz, "clássico". A natureza, portanto, não é a culpada, não é má, simplesmente, porque ela é uma propriedade inerente ao planeta em que vivemos. Ela impõe condições a serem satisfeitas para a vida pacífica. A vida na Terra possui um contrato implícito, e nós o assinamos, reconhecendo todos os possíveis riscos. Aliás, a natureza é, sim, deveras bondosa, deu-nos a possibilidade de explorar seus recursos para criarmos alternativas de sobrevivência.

Natal, neste mês de junho, é o exemplo mais próximo e recente que se tem de efeitos causados por chuvas em áreas de risco. A vítima mais marcante da desgraça foi o bairro de Mãe Luíza, onde uma cratera com 100 metros de largura, 10 de extensão e 30 de profundidade se abriu, em um movimento que aumentou o risco de desabamentos e mais deslizamentos. Teríamos sido pegos desprevenidos? A falta de prevenção é justificada? Uma notícia da Tribuna do Norte mostra que não. Consoante a reportagem, um documento datado de 2008 revela um estudo apontando 74 regiões de risco, o qual, de tão desatualizado, não contava com Mãe Luíza. Esse documento foi produzido por uma empresa sob contrato assinado com a prefeitura, que abandonou o projeto na administração passada. Um número alto assim deveria ter gerado uma preocupação maior, mas a questão foi ignorada.

E as chuvas continuam. Hoje, dia 23, preveem-se temporais igualmente devastadores. As regras do bom escrever dizem que agora deveriam ser propostas soluções, mas é difícil sentir-se motivado quando se sabe que o bem-estar da população não atiça o interesse por mudanças urgentes mais que uma Copa do Mundo iminente. Porém, como a solução é única, simples de entender e bem clichê (mas não por isso ilegítima), aí vai: é preciso votar bem, em alguém capaz de voltar as atenções à qualidade de vida da população... E, além disso... Bem... É melhor parar por aqui, porque se minha desmotivação continuar aumentando a cada tecla pressionada, entrarei em depressão profunda.

A cratera em Mãe Luíza

Referências:

http://tribunadonorte.com.br/noticia/areas-de-risco-solucao-engavetada/285573
http://tribunadonorte.com.br/noticia/tres-veiculos-ficam-soterrados-apos-novo-deslizamento-em-areia-preta/285684
http://tribunadonorte.com.br/noticia/previsao-e-de-chuva-intensa-ate-a-quarta-feira/285707
http://memoriaglobo.globo.com/programas/jornalismo/coberturas/chuvas-na-regiao-serrana-rj-/a-historia.htm

Respeito à opinião

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30.3.14

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Em uma discussão cotidiana, são frequentes os cruzamentos de opiniões divergentes sobre os mais diversos assuntos, desde questões subjetivas, como a preferência por sorvete de baunilha ou de chocolate; até tópicos objetivos, tais como a legalização do aborto e a aplicação de cotas raciais em universidades. Principalmente no segundo caso, no qual são tratados tópicos mais sérios, à proporção que o debate se acirra, e os participantes encaram o fantasma da discordância, surge uma expressão ameaçadora, capaz de dissolver qualquer resquício de conflito: "respeite a minha opinião". É nessa colocação que se encontra o embrião da comodidade e da estagnação intelectual, pois baseia-se no equívoco de considerar o verbo "respeitar" como sinônimo para "aceitar passivamente", quando, na verdade, o sentido mais adequado ao contexto democrático em que se vive seria "considerar ativamente".

Quando argumentos são meramente aceitos, ocorre uma concordância generalizada, cujos únicos produtos são pessoas satisfeitas por terem mantidas íntegras suas opiniões e imagens de bons debatedores perante os envolvidos na discussão, o que dá a sensação - na maioria das vezes, ilusória - de se estar sempre com a razão. Dessa forma, instaura-se uma inércia do pensamento, oriunda da inexistência de contra-argumentações racionais. Seguindo essa ideia, o status quo se manteria, porque não passaria de um conjunto de opiniões a serem "respeitadas".

O maior respeito a uma opinião - e ao seu emissor -, no entanto, seria a consideração desta, dentro do contexto de um debate de ideias, como uma parte imprescindível do processo racional, o qual implica, necessariamente, em se pesar o que é coerente e o que ultrapassa os limites do entendimento lógico. Isso, sim, significa compreender e relevar a diversidade de pensamento, enxergando as consequências de ideias mal-formuladas e abrindo espaço para transformações no modo de pensar as questões relevantes das esferas circundantes à vida do homem.

A ocorrência ou não desse equívoco está relacionada com a visão que se tem das discordâncias, em um debate, no contexto das relações interpessoais. Muitos invocam o "respeitar a opinião" ao verem suas capacidades intelectuais questionadas no momento em que suas ideias são postas em xeque. Como ninguém quer ser mal-visto, o mais interessante seria parar a discussão. Esse entendimento não considera os embates de pensamento como componentes capazes de aprimorar e construir novas significações, mas apenas como brigas destinadas à humilhação pública. Com essa falta de compreensão, não pode haver um efetivo aproveitamento das ferramentas democráticas, pois os participantes do sistema não têm a capacidade de utilizá-las.

Quando se tratando de ideias, o respeitar nada mais é que dar, a todas elas, a chance de serem destruídas ou aprimoradas, independente de quem as tenha proferido. É descortinar todas as fragilidades dos argumentos e, a partir deles, compor novos, através de um processamento crítico e lógico do pensar. Isso somente é possível quando se percebe o debate como uma situação de cooperação racional, e não de escarnecimento intelectual. É dessa maneira que a democracia se consolida, e as decisões concernentes a todos, em uma sociedade, bem como as opiniões cotidianas, tão apaixonadamente defendidas, tornam-se mais sensatas e comprometidas com a realidade e sua transformação.