Senta lá, SETURN. Revolta do Busão!

/**

20.9.12

0 comentários */
Quem ligou a televisão em busca de informações sobre a revolta que explode em Natal conseguiu nada mais além de âncoras reclamando dos seus repórteres barrados, policiais falando da violência dos manifestantes e pessoas cabisbaixas por perderem a novela das oito, devido a uns baderneiros que impediam o trânsito por não-sei-o-quê. Infelizmente, quem não apresenta afinidade com a rede mundial de computadores não pode abstrair o que realmente acontece em Natal.

Tudo começou quando o primeiro natalense enfrentou, pela primeira vez, um percurso pela cidade em um ônibus completamente lotado, onde foi espremido de todos os lados, por pessoas de todos os portes possíveis, e onde sentiu uma mistura gasosa, nunca antes sentida, penetrar pelas narinas e provocar uma sensação nauseante, a qual somente quem já sentiu sabe como é. As péssimas condições dos ônibus, o trânsito congestionado e as passagens já abusivas acumularam na população uma ira que, apesar de se dissolver na maioria, permaneceu em alguns milhares. O aumento da passagem de R$ 2,20 para R$ 2,40, na calada da madrugada do dia 28/08, foi apenas o estopim para os protestos que refletem toda a indignação armazenada nos natalenses.

Quem disse que não resolveria nada quebrou-se. As manifestações, que aconteceram numa frequência impressionante, resultaram na revogação do aumento da passagem. Os adesivos de "Tarifa R$ 2,40" foram jogados fora pouco depois de colocados. Vitória da população, derrota da SETURN, cuja desculpa para tal aumento fora a "crise" financeira no sistema de transportes, muito mal explicada, diga-se de passagem. É difícil entender como esse sindicato esperou que a população compreendesse a "causa" e aceitasse tranquila um aumento que ocorreu sem uma explicação e uma divulgação apropriadas. É o que dá o povo manter-se quieto por tanto tempo; os senhores ficaram mal-acostumados.

Quando todos achavam que havia acabado, que tudo voltara ao estado menos ruim em vigor antes do aumento fracassado, a SETURN voltou a mostrar suas garras. Garras? Não. Aquilo estava mais para birra infantil, uma pirraça de uma entidade desconhecedora da contrariação. Na segunda (17), o sistema de integração foi cancelado pelo sindicato. Desespero geral, todos mais revoltados do que nunca. Foi então que uma manifestação ocorreu na terça-feira (18), com o objetivo de anular essa determinação e tudo voltar como era.

O ato começou em frente ao Shopping Via Direta e alcançou o Shopping Midway Mall. E foi então que as polêmicas começaram. Assim como no primeiro protesto da chamada Revolta do Busão, a polícia agiu com intensidade. E isso quer dizer que balas de borracha foram atiradas, pessoas foram ameaçadas e manifestantes foram presos. Apesar de chegarem notícias sobre atos violentos por parte dos manifestantes, também vieram à tona fatos de violência policial contra pessoas que, até mesmo, não tinham relação com o protesto. Mesmo quem estava no protesto foi violentado sem justificativas plausíveis. E isso revela um tremendo despreparo da polícia brasileira para situações como essa, o que faz lembrar o modo de agir dos militares durante a ditadura, evidenciando que o problema não é de hoje, como bem aponta o "Guia Politicamente Incorreto da História do Brasil", de Leandro Narloch, quando fala:

"Outro motivo que levou os militares e a polícia a recorrer tanto à tortura para destruir os grupos de luta armada foi o fato de serem estupidamente inexperientes na arte de investigar. Em duas grandes movimentações do exército naquela época, mais de mil soldados cercaram menos de dez guerrilheiros, sem conseguir agará-los."

Como bem diziam os manifestantes, "polícia é pra ladrão, pra estudante não!".

Enquanto o protesto acontecia, o Ministério Público do estado ajuizou uma ação contra a atitude do SETURN, postulando que "as promovidas, com a finalidade de provocar aumento da tarifa de ônibus e/ou os seus lucros, de modo unilateral e ilegal, deixaram de aplicar o disposto na Portaria Semob 164." Com toda a pressão, saiu a notícia, na quarta-feira (19), de que o serviço de integração volta a funcionar dia 20, quinta-feira, para a felicidade geral do povo. Há quem diga que isso não aconteceu pelos protestos, mas, sim, porque o sindicato teria de pagar multa caso não cumprisse as determinações. Essa é uma forma simplista de ver as coisas. Afinal, será que essa questão da integração ganharia tanta atenção se a população não tivesse se movido?

Quanto aos ônibus queimados, o que se pode dizer é que foi uma atitude impensada, desnecessária, exagerada, pois já se tinha a notícia de que o SETURN estava recuando. Uma radicalização dessas precisa ser muito bem analisada. Não obstante, não se podem condenar os manifestantes, afinal, os empresários deixaram ainda mais evidente o total desprezo pela população, o que só fez aumentar a revolta. Atitudes como essa podem gerar tanto consequências negativas, quanto positivas. O tempo dirá qual foi o saldo do dia 18.

Em resumo, foi muito gratificante ver o povo se movendo. Apesar de isso ter acontecido apenas pela questão de o transporte trazer danos financeiros imediatos no bolso de cada um, foi uma iniciativa louvável para uma população que parecia totalmente anestesiada. Agora, o que se precisa é manter tais atitudes para questões mais coletivas e menos imediatistas, como a educação e a saúde, por exemplo, as quais se encontram em uma situação deplorável não só no estado do RN, como em todo o território brasileiro.

nota 1: desculpem por não poder colaborar com o protesto, devido à minha condição de filho menor de idade, mas acompanho o movimento e espero, com este texto, contribuir com a documentação dessa movimentação memorável.


Nenhum comentário:

Postar um comentário